sexta-feira, 22 de março de 2013

Desabafo

Por que busco fora de mim o que me é de dentro?
Por que busco nos outros o que quero de mim mesmo?
O que espero eu, de mim mesmo?
O que espero eu dos outros?
De que me adianta a aprovação e os incentivos externos,
se, escondido pelas sombras, me traio, me apunhalo?

Dia após dia, nos convencemos a seguir em frente.
Mas para que? Para onde? Para quando? Para quem?
De que me serve isso diante do todo?
De que serve tudo o resto, diante da morte?
Quem mais haveria de ser, depois da morte?

Engraçado pensar que o peso da vida, jaz na morte.

E no final das contas, é simplesmente isso.
Gastamos a Vida temendo a Morte, carregando-a como um peso.
Então, quando morremos, ficamos mais leves. Será?

Será um alívio o cessar do ser?
Será confortante o último suspiro?
A libertação do peso?
Mesmo que assim seja,
de que me serve ser leve, se eu não mais for?

Não desejo a morte. Muito pelo contrário. Nada mais lindo do que a vida.
Em qualquer circunstância ela nos encontra, nos renova a esperança.

O que há de se fazer na vida, além de vivê-la?
Não é este nosso único objetivo? 
Ser vivo enquanto vivo pudermos ser?
Aproveitar o que puder, até que o plano imutável,
o final derradeiro, o nada infalível, estático e inevitável venha lhe chamar, lhe clamar
 E, se você der sorte, quem sabe até lhe aclamar.

Por que então temer a morte?  Receá-la? Odiá-la? Amaldiçoá-la?
Se ela é inevitável, por que sequer considerá-lá?
Saiba que ela estará lá para ver seu último dia, mas some dias no caminho, antes de abraçá-lá.
Sem ela, qual a real motivação para vivermos de verdade?


De que nos adianta planos e sonhos adiados, não realizados, esquecidos?
Que nos frustram dia a dia? Minam vontade e energia?
Que nos pegam pela mão e nos casam com o conformismo tedioso da rotina, nos matando devagar?
Planos que dia após dia, nos distanciam de nós mesmos e nos aproximam do "zelador" do fim, que, chegada a hora, finalmente baixará as cortinas do palco, e as palmas não ecoarão...

Quem é este personagem, que desvia nossa atenção da estrada de tijolos de ouro?

Que nos divide e nos esquarteja minuciosamente, diminuindo nossa existência?
Que nos afasta de nós mesmos e dos outros a uma distância irreal e assustadora, até que nos reste apenas beijar sua mão e admirar seu espetáculo, sozinho, em silêncio.

Quem mais senão nós mesmos?

Quem se destrói e se constrói constantemente?
Quem se sabota e se ajuda?
Nós.
Esses seres ridículos, patéticos, ínfimos, mortais, megalomaníacos e incoerentes.

Nada realmente é, perante a mim, perante a ti, perante a tudo.

Divago de mim mesmo, pois para cada ideia inovadora, cada sonho alegre e promissor, Eu me revelo.
Avassalador, assustador, dominador, incontrolável, censurador.

Se eu ao menos pudesse controlar isso, controlar a mim.

Se fizesse um pacto comigo, algo que me tornasse único como "Yang & Ying."
Torná-lo-ia em meu parceiro, amigo, cúmplice, aliado.

Assim, verdadeiramente, poderíamos os dois, ser apenas um.

Na plenitude do ser, na imensidão do saber, na desnecessidade do ter.
Quem sabe, liberado de sua agonia, de nossa agonia, alimentados da angústia,
juntaríamos ele e eu, os nobres, os justos, os pobres, os loucos, os bobos e os felizes.

Um Nobre.
O que seria um "nobre" afinal? Um pobre de alma?

E um justo, e o que este defende? A si próprio? A sua família? Aos indefesos?
A justiça é cega e subjuga a todos, com valores "arbitrários", partidários.
Valores que insistimos em impor sobre os que são diferentes do "aceitável".
Dos que se desviam do cidadão "médio".
Pois somos nós, os detentores do conhecimento "humanitário",
do conhecimento comunitário, do conhecimento.

Nós somos o conhecimento totalitário. 

E somos também a arma que impõe a tal "justiça".
E para isso temos o pleno preparo,
os aparatos para discernir e aplicar o errado e o certo.
Certo?
Será?

Dentro de mim, a melancolia da impotência me congela, me esconde e me desculpa.

Desculpa? Não sei.
Sei que sou apenas um só, dividido entre muitos, entre vários.

Sou muitos e sou pouco.

Incompleto, incerto, inconstante, incoerente, carente.
Carente de mim. Carente para mim. Carente para ti. Carente para todos.

Então, como podemos eu, sendo apenas alguns, na vida, além da vida, viver?

Assim, a fidelidade que tenho para comigo de nada vale. Pois me traio de novo e de novo.
Escondo-me de mim mesmo atrás de máscaras com meu semblante.
Me traio quando convém e me engano como ninguém.
Culpo a tudo e culpo a nada.

Escondido em minha revolta, fico quieto e fecho meus olhos.

Mas até quando?
Quem nunca se absteve de solidarizar com algum desconhecido por vergonha?
Quem já não olhou nos olhos de um estranho, e baixou a cabeça ao invés de lhe sorrir e desejar bom dia? Quem nunca deixou de fechar outro carro no trânsito por pura birra?
Quem somos nós a quem chamamos de sociedade?
Quem somos nós na dentro da sociedade?
Que sociedade nós temos se nem a nós mesmos conhecemos?

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