sexta-feira, 27 de julho de 2012

Identidade


Quem sou eu, onde estou?
Serei eu apenas mais um número,
um simples RG?
Talvez você possa me dizer.
O espelho se cansou de tentar,
meu reflexo nunca soube me falar.
Passei muito tempo
procurando me entender.
Tudo que consegui,
foi cansar de me perder.
Quem sabe, se através do seu olhar,
eu consiga finalmente me enxergar?
Muito me olham e poucos me veem,
o difícil é saber quem.
Sei que sou um quebra-cabeças,
complicado de se terminar.
Mas há de ter alguém disposto a tentar.
Mergulhar em si mesmo é perigoso,
pois a razão engana e o caminho é tortuoso.
Muitos dos que tentaram não retornaram,
os outros poucos, não se encontraram.
Se nos outros eu procurar,
talvez um dia consiga me achar.
Pois somos como uma colcha de retalhos inacabada,
tentando se completar ao longo da estrada.
É nos outros que encontramos pedaços de nós,
por isso somos incompletos quando estamos sós.
Sozinho, só faço querer,
pois com você consigo ser.
Sozinho posso estar,
mas só em você irei me encontrar.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Saudade

Saudade é memória, é desejo, é história.
Saudade é um sentimento que remete a outrora,
pega o que já foi e renova, revigora. 
É uma viagem a outro tempo,
que já foi e não retorna. 
Saudade é o futuro do presente,
a vontade do ausente,
é o antes do agora.
Com saudade, a gente sorri, a gente gargalha, a gente chora.
Porque saudade é nostalgia, é alegria, é aleatória.
Pode vir de noite ou de dia,
pode vir a qualquer hora.
Vem quando queremos ou quando esquecemos,
por vezes vem rápida ou então demora.
Saudade é um sentimento avassalador que, delicado, te devora.
Saudade é tudo e mais um pouco,
faz de tudo e te faz louco.
Saudade é vida vivida, vida sentida, vida Senhora.
Saudade é a vitória, é o amor, é a glória.
Saudade não discrimina nem raça e nem sexo.
Não separa o simples do complexo.
E com certeza não liga para o sentimento anexo.
Saudade é a vontade do antes no agora.
Saudade é memória, é desejo, é história.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Homem de Lata


Ando procurando um lugar para guardar meu coração. Com o peito pesado é difícil tomar alguma decisão. A cabeça fica a mil, a concentração quase inexiste. Em casa ou em exílio, por vezes me isolo comunicativo, me escondo pensativo atrás da extroversão. Eu poderia deixá-lo a pulsar, enterrado ao pé de alguma árvore, ou então seguro dentro de um cofre. Mas acabaria por perder o local ou me esquecer do segredo. Quando me concentro no mundo à minha volta, meu coração ora fica esquecido, tendo seu peso anulado, ora compõe a paisagem com perfeição, tal qual uma baleia no oceano. Uma caixa de sapato no armário talvez resolvesse, mas ainda sim seu compasso me marcaria. Leve ou pesado, meu coração ocupa minhas mãos, furtando-me da agilidade habitual e tornando-me estabanado, como um gato sem o rabo. Quem sabe se eu o escondesse num samba animado, conseguiria pensar livremente. Mas poderia acabar me encontrando perdido em uma doce batida, eterna e sedutora. Sem resposta, sigo levando a vida como posso. Diante das bifurcações que se apresentam no caminho, tento escolher a opção que me levará por cenários mais alegres. Com passos decididos e incertos desbravo a estrada devagar. Atento à paisagem, sigo me juntando aos loucos, pois a única certeza que tenho é a de que, normal, não quero ser.

Sanhaço Azul

No meu jardim vive um sanhaço azul. De longe ouço-o cantar alegre. Porém, ao me aproximar, o sanhaço emudece interrompendo uma linda melodia. Oh sanhaço, por que não cantas para mim? Por acaso tens medo que eu tente aprisioná-lo em uma gaiola de madeira? Digo que não lhe desejo engaiolado e infeliz. Desejo apenas a felicidade que teu canto me traz, mesmo em um dia ruim. De nada valhe uma gaiola, pois nela não mais serás o sanhaço azul de meu jardim. Ainda assim, tentas em vão esconder-se dentre as folhas das copas. Mas posso ver-te e admirar-te a beleza. Apenas não ouço tua melodia, que me faz leve a cabeça. Vez ou outra me enganas, entoando assovios desconexos. E em vão, espero-te cantar. Tento lhe dizer que não lhe quero mal. Nada parece surtir efeito. Por vezes, embriagado pela própria alegria, ensaias uma curta melodia. Mas logo lembras de minha presença e cala-te novamente. Até em meus sonhos recusa-se a cantar para mim. Distante e tão perto. Desperto e tão longe. Já não sei o que fazer para lhe ver cantar. Se ao menos eu pudesse assoviar como ti, talvez conseguisse convencê-lo a cantar para mim. Quem sabe se algum dia eu aprendo a assoviar e talvez cantemos juntos, alegrando assim nosso belo jardim.