terça-feira, 28 de junho de 2016

Ensaio Sobre a Cegueira

Eu mesmo ando dormente.
Sinto algo incômodo, latente.
Um vazio que me toma quando saio de mim.
Quando olho em volta e vejo tudo assim.
Um vazio que me assola quando volto para dentro.
Que transborda minha mente, em meu peito.
Um sentimento crescente, incessante, indecente.
Uma enchente que me lava a alma e leva embora a alegria.
Deixando apenas uma única vontade, a de nascer outro dia.
Pois hoje só se separa, só se dispara, mas nunca se para.
E o amanhã se escancara, se encara, mas não se repara.
E fico no frio, que vem do vazio e que me deixa no fio da navalha.
Que me corta carne, me corta o osso, dilacera a mente, mas deixa o caroço.
Se não, é o calor, que espalha o torpor, cozinha a flor, junto dessa gentalha.
É mesmo difícil para eu entender, e mais doloroso ainda de ver.
Toda essa descrença, todo esse sacrifício, todo esse sacrilégio.
Eu sinto o ódio, penso a Ignorância, e vivo a morte.
Tudo que espero é algo menos severo, um quê de sorte.
Mas de tanto esperar, deito gelado, até adormecer.
E de tanto dormir, de tanto sonhar, não vejo viver.
E vivo cansado, e vejo calado esse doer.
E sigo culpado, olhando pro lado, sem nunca ceder.
E ando para frente, olhando essa gente, querendo morrer.
Mas isso não é Vida, não é a saída, é apenas sofrer.
Quem sabe algum dia, talvez eu acorde.
Quem sabe algum dia, o mundo recorde.
Quem sabe algum dia, você...
Quem sabe nós...
Quem sabe...
Quem...